Por Roger Oliveira de Mattos¹
RESUMO
Este artigo tem por objetivo explanar a doutrina do Espírito Santo (Pneumatologia) e sua contribuição para a espiritualidade cristã pentecostal. Por meio do batismo no Espírito Santo — uma doutrina central do pentecostalismo, de cunho carismático — os crentes recebem um revestimento de poder, cujo propósito é o serviço de evangelização e missões, além das experiências que Ele proporciona. A teologia pentecostal tem como pilares os escritos do teólogo, médico e historiador Lucas: o Evangelho relatado por ele e, especialmente, o livro de Atos dos Apóstolos.
PALAVRAS-CHAVE: Pneumatologia; Espírito Santo; Pentecostalismo.
ABSTRACT
This article aims to explain the doctrine of the Holy Spirit (Pneumatology) and its contribution to Pentecostal Christian spirituality. Through the baptism in the Holy Spirit — a central doctrine of Pentecostalism, of a charismatic nature — believers receive a power anointing, the purpose of which is for the service of evangelism and missions, in addition to the experiences He provides. Pentecostal theology is grounded in the writings of the theologian, physician and historian Luke: the Gospel recorded by him and, especially, the book of Acts of the Apostles.
KEYWORDS: Pneumatology; Holy Spirit; Pentecostalism.
¹ Bacharelando em Teologia pela Faculdade Refidim.
E-mail: rogerdums87@gmail.com
INTRODUÇÃO
O Espírito Santo é a terceira pessoa da Trindade. Isso não indica uma posição hierárquica, tendo em vista que Deus é um ser trino — Pai, Filho e Espírito Santo —, pessoas distintas, mas com a mesma natureza divina. Ele é o Consolador, enviado por Jesus para estar com todos os que creem e para instruí-los em toda a Verdade.
Na obra Teologia Sistemática Pentecostal, o saudoso mestre Antonio Gilberto (2008, p. 173) descreve:
Pneumatologia é a doutrina do Espírito Santo quanto à sua deidade, seus atributos, obras e operações.
O termo pneuma (gr. \”o ar\”, \”vento\”), cognato do verbo pnéo, \”respirar\”, \”soprar\”, \”inspirar\”.
Significa, na Bíblia, principalmente o espírito humano, que, com o vento, é invisível, imaterial, dinâmico, potente.
Mas pneuma (hb. ruach) diz respeito também ao Espírito de Deus, a terceira pessoa da Trindade.
O Espírito de Deus não é uma força, um poder ou uma influência, mas uma Pessoa, ou seja, o próprio Deus.
Para compreender isso, basta analisar a situação: o Senhor Jesus enviou o Consolador para estar com os crentes em Seu lugar. Logo, para suprir tal função, Ele só pode ser um Ser divino.
A partir do momento em que o indivíduo aceita Jesus como seu Salvador, ele é selado pelo Espírito Santo, que regenera e santifica. Contudo, a pneumatologia pentecostal enfatiza o batismo com — ou no — Espírito Santo. Esse batismo é de cunho carismático, ou seja, envolve a manifestação dos dons espirituais.
Diferente do batismo pelo Espírito Santo, o batismo no Espírito Santo não ocorre no ato da salvação; ele vem após a salvação.
Em outras palavras, é um revestimento de poder oferecido aos que já são salvos e justificados.
PENTECOSTALISMO E PNEUMATOLOGIA PENTECOSTAL
É importante frisar o que é o Pentecostes e como surgiu o movimento pentecostal. O Pentecostes era a quarta das sete festas sagradas instituídas por Deus no período veterotestamentário. Também conhecida como Festa das Semanas e Festa das Colheitas, ocorria no terceiro mês, Sivã, e durava um dia — o dia 6 de Sivã, mês que corresponde aproximadamente ao nosso mês de junho. Pentecostes era a festa central das sete que o Senhor determinou para Israel (GILBERTO, 2008).
O movimento pentecostal surgiu no início do século XX e tem suas raízes no Movimento de Santidade do século XIX, oriundo do metodismo de John Wesley. Esse movimento enfatizava a doutrina da “segunda bênção”, que sucedia a conversão. A partir dessa experiência, o crente experimentava uma santificação profunda, promovendo uma vida de pureza e integridade.
No ano de 1901, com o advento de um pregador do Kansas, EUA, chamado Charles Fox Parham, deu-se início ao pentecostalismo. Ele ensinava sobre a busca do batismo no Espírito Santo. Em certa ocasião, durante uma reunião de oração, uma de suas alunas começou a falar em línguas e, desde então, ficou estabelecida a evidência inicial do batismo no Espírito Santo.
O marco principal do movimento pentecostal ocorreu em 1906, quando se deu o Avivamento da Rua Azusa, sob a liderança do pastor afro-americano William J. Seymour, em Los Angeles, Califórnia. Seymour foi fortemente influenciado pelos ensinamentos de Parham quanto à busca do batismo no Espírito Santo. Durante o avivamento, muitas manifestações espirituais ocorreram, atraindo pessoas dos Estados Unidos e de várias partes do mundo. Desse modo, a mensagem pentecostal se expandiu.
O pentecostalismo chegou oficialmente ao Brasil por meio de dois missionários suecos batistas, Daniel Berg e Gunnar Vingren, que receberam o batismo no Espírito Santo nos Estados Unidos. Eles foram influenciados pelo movimento pentecostal americano, especialmente pelo avivamento de Chicago, ligado a William H. Durham. Chegaram ao Brasil em 1910 e se estabeleceram em Belém do Pará, onde começaram a ensinar sobre o batismo no Espírito Santo e a prática do dom de línguas. Em 1911, foi fundada a igreja Missão da Fé Apostólica, que, mais tarde, em 1918, passou a se chamar Assembleia de Deus, tornando-se a maior denominação pentecostal do país.
Simultaneamente, em São Paulo, o missionário italiano Luigi Francescon fundou a Congregação Cristã no Brasil em 1910, introduzindo outra vertente do pentecostalismo. Ele também havia sido influenciado pelo movimento pentecostal nos Estados Unidos e trouxe consigo ênfases na cura divina e no batismo no Espírito Santo. Essa foi a chamada primeira onda do pentecostalismo, também conhecida como pentecostalismo clássico.
A teologia pentecostal tem suas raízes firmadas nas narrativas de Lucas, especialmente no livro de Atos dos Apóstolos. O episódio crucial encontra-se em Atos 2, no qual ocorre a descida do Espírito Santo sobre uma casa onde estavam reunidas pessoas de diversas nacionalidades no dia de Pentecostes. Durante o derramamento do Espírito Santo sobre aqueles que ali se encontravam, houve a manifestação de línguas como que de fogo repartidas.
O batismo com o Espírito Santo tem como evidência inicial o falar em línguas estranhas. A manifestação de falar em línguas também é citada na lista de dons espirituais na primeira carta aos Coríntios. Quando o crente é batizado no Espírito Santo, ocorre a manifestação do falar em línguas estranhas, e não a precede — “foram cheios do Espírito Santo, e começaram a falar noutras línguas” (At 2.4). Na passagem, a expressão “e” (em grego, καί — kai) é uma conjunção coordenativa.
A pneumatologia de Lucas difere da pneumatologia de Paulo. Enquanto a primeira tem um cunho carismático, a segunda é de cunho soteriológico. Em outras palavras, do ponto de vista de Lucas, a expressão “cheio do Espírito Santo” é de dimensão carismática no sentido de ser revestido de poder para realizar o testemunho e o serviço eficaz do Evangelho (POMMERENING; GUNLANDA, 2019). O propósito do batismo com o Espírito Santo transcende a experiência em si; ele impulsiona o crente a evangelizar, testemunhar e fazer missões de forma mais profícua.
Diferentemente da pneumatologia lucana, do ponto de vista da teologia paulina, o Espírito Santo atua na santificação e manutenção da salvação, ou seja, de forma soteriológica. Apesar das diferenças, ambas se complementam. Segundo relata Pommerening (2024, p. 32): “Na Teologia Pentecostal, o Espírito Santo batiza a pessoa em Cristo na conversão (primeira bênção – 1 Co 12.14), e Cristo batiza o crente no Espírito Santo no ato da experiência pentecostal (segunda bênção – Lc 3.6)”.
BATISMO NO ESPÍRITO SANTO
O batismo no Espírito Santo é uma tônica no pentecostalismo. Por meio desse processo, o crente é capacitado para proclamar o Evangelho e recebe um revestimento espiritual para edificação própria e coletiva. Todavia, deve-se ter uma busca para receber tal batismo.
O doutor Pommerening (2024, p. 39), em seu livro Teologia da Experiência, afirma:
O Espírito Santo, no ato do batismo, comunica, transmite e insere no crente o amor de Deus, fazendo-o sentir-se amado e querido, sendo acompanhado do falar em línguas como evidência inicial e a prática do amor como uma evidência contínua. Além da imersão no amor de Deus, o fogo do Espírito queima as impurezas no coração do crente e potencializa, aviva e dinamiza as virtudes.
Há uma controvérsia sobre o significado do batismo com o Espírito Santo e com fogo, proclamado pelo profeta João Batista (Mt 3.11), mesmo dentro do pentecostalismo. Uns defendem que o batismo com fogo, na passagem acima, se refere ao juízo vindouro, enquanto outros sustentam a posição de que esse batismo é com o fogo purificador. Entretanto, a grande maioria dos pentecostais opta pela segunda opção.
Pommerening (2014, p. 39) ainda relata:
[…] Cabe esclarecer, no entanto, que cristãos não batizados no Espírito Santo também podem desenvolver ardor missionário e a transformação ética do amor. O batismo no Espírito Santo não diferencia, portanto, os crentes em classes superiores, mais espiritualizados, mas certamente facilita a observância de uma vida espiritual virtuosa e um ardor missionário.
O propósito do batismo no Espírito Santo é a expansão do Reino de Deus e a promoção da unidade e uniformidade dos salvos, ao contrário do sectarismo. Ou seja, a inclusão de todos no Corpo de Cristo, independentemente de sua confissão de fé. Conquanto seja realizada a evangelização e as missões por todo o mundo, a experiência proporcionada pelo batismo no Espírito Santo torna o crente mais eficaz na proclamação do Evangelho.
DONS ESPIRITUAIS E SUAS UTILIDADES PARA O SERVIÇO
Conforme observa Antônio Gilberto:
O dom espiritual é uma dotação ou concessão especial e sobrenatural pelo Espírito Santo, e de capacidade divina sobre o crente, para serviço especial na execução dos propósitos divinos para e através da igreja (GILBERTO, 2008, p. 195).
Existem os dons naturais, provenientes de Deus para a criação da natureza (fauna, flora, água, ar, fogo, luz) e os dons na esfera humana (talentos, aptidões, virtudes, qualidades). Não obstante, o dom que provém do Espírito é um dom sobrenatural com o intuito de promover a expansão da igreja e a edificação dela.
Esses dons encontram-se em 1 Coríntios (12), Romanos (12) e Efésios (4). Os dons listados nesses livros referem-se ao serviço (διακονία) para com os santos. Dividem-se em dons espirituais e ministeriais, ambos destinados ao serviço cristão.
A manifestação do Espírito é concedida a cada um visando a um fim proveitoso. Porque a um é dada, mediante o Espírito, a palavra da sabedoria; e a outro, segundo o mesmo Espírito, a palavra do conhecimento; a outro, no mesmo Espírito, a fé; e a outro, no mesmo Espírito, dons de curar; a outro, operações de milagres; a outro, profecia; a outro, discernimento de espíritos; a um, variedade de línguas; e a outro, capacidade para interpretá-las. Mas um só e o mesmo Espírito realiza todas estas coisas, distribuindo-as, como lhe apraz, a cada um, individualmente (1 Co 12.7-11).
Vale ressaltar que, para exercer os dons, não é necessário ser batizado no Espírito Santo; porém, o crente que recebeu o batismo com o Espírito Santo pode exercer os dons de forma potencializada. Pode-se afirmar, portanto, que, embora não seja condição para o exercício dos dons, o batismo no Espírito Santo intensifica sua manifestação.
De acordo com o renomado teólogo assembleiano Anthony D. Palma (2007, p. 18):
“O Batismo com o Espírito Santo é um pré-requisito para receber os dons espirituais”. Mas onde encontramos isso nas Escrituras? O povo de Deus experimentou todos os dons nos séculos anteriores ao Dia de Pentecostes. É mais correto dizer que o batismo no Espírito Santo intensifica a sensibilidade e a receptividade espirituais, fazendo da pessoa um candidato mais propenso aos dons espirituais. Isso é amplamente demonstrado pelo fato de que há maior incidência dos dons entre aqueles que foram batizados no Espírito Santo do que entre os que não foram.
Essa dádiva dada por Deus Pai tem maior proveito quando se crê que os dons estão vivos na presente era. Sendo assim, o crente é capacitado para servir à sua comunidade de fé de forma saudável. Contudo, é importante ter diligência no tocante aos dons, para que a igreja não seja prejudicada pelos excessos. “Tudo, porém, seja feito com decência e ordem” (1 Co 14.40).
Em diálogo entre Pommerening e Gulanda (2019, p. 93), no artigo Alteridade, convivialidade e escuta: princípios para uma prática pentecostal do cuidado, afirma-se:
[…] O pentecostalismo, portanto, não pode reduzir a ação do Espírito Santo a si, sob pena de trair o próprio movimento. De igual forma, a Teologia Pentecostal não deve se ocupar somente com a hipervalorização dos dons carismáticos em detrimento da amplidão do agir do Espírito. Sendo assim, a vida segundo o Espírito não se resume a uma condição confortável, antes, torna-se movida pelo paradigma pneumatológico e associa-se à forma pela qual o Espírito Santo acolhe a humanidade, cuidando-a, conduzindo-a para o caminho de Deus […].
Os dons espirituais também servem para atrair descrentes por meio do cuidado. Através da ação do Espírito, manifesta-se vida onde há morte espiritual. Por isso, gera-se bem-estar nos ambientes onde faltam empatia, concórdia e solidariedade, graças à influência do Santo Espírito.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Espírito Santo é responsável por proporcionar vida; porém, só é possível obter os benefícios que Ele oferece por meio do relacionamento, uma vez que Ele é uma Pessoa. Para receber o batismo no Espírito Santo e ser revestido de poder, primeiramente é necessário crer e, sucessivamente, buscar por meio das disciplinas espirituais: oração, jejum e meditação na Palavra de Deus.
Dessa forma, o crente é capacitado pelo Espírito Santo para proclamar o Evangelho com mais ousadia e autoridade, além de intensificar a operação dos dons espirituais. O propósito desse revestimento transcende a experiência individual: trata-se de uma capacitação de cunho evangelístico e missionário, destinada à expansão do Reino de Deus e à edificação do Corpo de Cristo.
O crente que recebe o batismo com o Espírito Santo usufrui dos dons para servir à Igreja — o Corpo de Cristo. No entanto, os dons também têm utilidade para alcançar os não salvos em Cristo Jesus, promovendo vida, cuidando dos desamparados, curando os enfermos e operando milagres e maravilhas. Assim, o Reino de Deus se expande até os confins da terra.
REFERÊNCIAS
GILBERTO, Antonio. Teologia Sistemática Pentecostal: Pneumatologia. 2. ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2008.
PALMA, Anthony D. Os dons e o fruto do Espírito. In: Mensageiro da Paz. Rio de Janeiro: CPAD, 2007.
POMMERENING, C. I.; GULANDA, O. A. C. Alteridade, convivialidade e escuta: princípios para uma prática pentecostal do cuidado. Joinville: Reflexus – Revista de Teologia e Ciências das Religiões, 2019.
POMMERENING, Claiton Ivan. Teologia da Experiência: implicações afetivas e racionais na interpretação pentecostal das Sagradas Escrituras. Rio de Janeiro: CPAD, 2024.
SAGRADA BÍBLIA. Almeida Revista e Atualizada. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993.